Existem tradições que, de tão antigas, não sabemos o porquê são assim. Uma delas é sobre uma prática muito comum em algumas famílias. Todas as mulheres, ao prepararem um prato a base de peixe ao forno, cortavam a cabeça e o rabo do pescado. Depois de provar o prato, questionamos sobre o motivo à uma jovem do clã, a mesma respondeu que não sabia, mas que esta prática foi-lhe ensinada pela mãe. Questionando à mãe, obtivemos a mesma resposta! Como a avó da primeira entrevistada morava um tanto distante, tivemos que realizar uma pequena expedição para entrevistá-la. Mas isto não foi motivo para pararmos a investigação, e lá fomos atrás da matriarca.
“Minha senhora, hoje pudemos experimentar um prato de peixe sem cabeça e sem rabo, que sua neta preparou, e descobrimos que foi a senhora quem ensinou a receita. É verdade?’Ao que a velhinha perguntou intrigada: ‘Peixe sem cabeça e sem rabo? Não me lembro de nenhuma receita assim. Quais são os ingredientes?’ Respondemos: ‘Tomate picado, cebola, azeite de oliva…’E ela interrompeu: ‘Ah! Já sei… É realmente um prato muito bom. Pena que, na minha época, o forno era pequeno e não cabia o peixe inteiro. Ficaria muito mais bonito se deixasse a cabeça e o rabo…’.”
Brasil, sertão, 2018, Universidade Federal do Vale do São Francisco. Os estudantes dos cursos de engenharia, que tipicamente fazem 6 a 8 disciplinas, preparam-se para as “provas finais” do semestre. Durante a avaliação regular, caso a média seja menor que 7.0 e maior ou igual a 4.0 (em linguagem matemática: 4.0 ≤ media < 7.0) , o estudante será obrigado a realizar uma “prova final”, onde a nota da mesma, em média aritmética com a média regular, deve ser igual ou superior a 5.0. Caso consiga o resultado mínimo será considerado aprovado com média 5.0.
Mais ou menos assim, quem não obteve média regular maior ou igual a 7.0 (média ≥ 7.0) será “castigado” com a necessidade de fazer uma prova da respectiva disciplina e das demais em que foi “penalizado”, em um período, segundo o calendário acadêmico, de uns cinco dias letivos, ou menos até! No caso de um estudante que tenha obtido, 6.5 em oito disciplinas, o mesmo terá que fazer 6 a 8 provas em cinco ou três dias uteis!
Por que tem que ser assim?! ! Emoção? Sofrimento e ansiedade induzidos? Onde foi decretada esta tradição? A chamaremos de “o inferno das finais.”
Brasil, São Paulo, Universidade de São Paulo, USP, uma das maiores universidades da América Latina, a maior e melhor do Brasil (tudo bem, dependendo do ranking a UNICAMP é até melhor)! Os estudantes da Escola Politécnica, assim como todos os demais estudantes da universidade, após realizarem os exames regulares, caso obtenham média igual ou maior que 5.0 (média ≥ 5.0), já estão de férias, merecidas férias! Um estudante de engenharia que obtiver 6.5 em oito disciplinas é considerado um bom aluno! No entanto, caso algum destes estudantes tiver obtido uma média maior ou igual a três e menor que cinco (3.0 ≤ media < 5.0) e tido frequência superior ou igual a 70%, terá direito a uma prova de “recuperação” com data definida pelo docente, antes do início do semestre subsequente. Resumindo, a média para passar na USP é 5,0. Quem tirar 3 pode fazer uma recuperação que consistirá de provas ou trabalhos programados, a serem realizados entre o final do semestre letivo e o início do semestre seguinte. Textualmente:
As notas variarão de zero a dez, podendo ser aproximadas até a primeira casa decimal (art. 83, RG).
Será aprovado, com direito aos créditos correspondentes, o aluno que obtiver nota final igual ou superior a cinco e tenha, no mínimo, setenta por cento de freqüência na disciplina (art. 84, RG).
SISTEMA DE RECUPERAÇÃO
Os alunos que não tiverem alcançado nota final de aprovação em disciplinas dos cursos de graduação, mas que tiverem obtido freqüência mínima de setenta por cento e nota final não inferior a três, poderão efetuar uma recuperação que consistirá de provas ou trabalhos programados, a serem realizados entre o final do semestre letivo e o início do semestre seguinte. Em casos excepcionais, e não sendo disciplina-requisito, o prazo para a realização da recuperação poderá ser prorrogado até o final do semestre subseqüente ao da reprovação. Extraído da página de informações acadêmicas da USP.
Ah! Mas . . . mas o quê? Não existe certo ou errado, mas sim existem sistemas de avaliação que criam desnecessariamente formas de estresse. A UNIVASF tem quase 14 anos de funcionamento, já passou do tempo deste tema ser questionado! Mas todas as “tradições”, como “o inferno das finais”, possuem seguidores . . . e as instituições seguem suas tradições, uma delas é a inércia . . .